sábado, 29 de dezembro de 2007

27/12 - Lazy day




Acordei às 7h, mas o dia estava chuvoso e ventava muito, virei para o lado e dormi, coisa que não posso fazer com meus alunos em Porto Alegre. Às 8h, as coisas continuavam iguais lá fora, então chutei o balde, e decidi só acordar quando o sono acabasse, já sabíamos que o mar iria piorar. Levantei mesmo só depois das 10h, o Cauê, mais uma vez, cobriu-se até a cabeça e seguiu sonhando. Falei com o Julião, que reclamou por não ter rolado a prática, e me disse que as ondas estavam ruins.
Entrei no quarto e iniciei um sádhana. Enquanto fazia os ásanas, o Jadson bateu na porta e perguntou se eu sabia do horário e das ondas. O Cau acordou e não me deixou acabar a prática, ficou conversando comigo enquanto eu tentava fazer uma técnica de descontração.
Saímos do quarto, o dia continuava nublado, convidamos o Jadson para surfar, ele continuava jogando via internet, como faz o tempo todo em que está em casa. Passamos para pegar o Bruno e fomos olhar Off The Wall, por sugestão do Jadson. As ondas não estavam nada boas, mas dali deu para ver que em Rocky Point tinha muita gente, então decidimos surfar com menos gente e fomos pegar nossas coisas no carro.
A onda em Off The Wall, é muito rasa, depois que você acaba-a quase sempre toca com os pés no chão. Peguei uma onda boa e andei toda ela por dentro de um tubo, quando já achava que tinha saído, o lip bateu na minha cabeça, derrubando-me. Mesmo não tendo feito o tubo completo, com aquilo já tinha ganhado o dia. A onda vista de dentro, nos dá uma outra dimensão de tempo e espaço, é uma experiência incrível que nenhum outro esporte proporciona. Para mim, aqueles míseros segundos, duraram muito tempo, e aquela imagem de ver a onda rodando por cima de mim, não me saia da cabeça. Um tempo depois vi o Bruno fazer um tubo completo, saindo dele sem ser tocado pela onda. Parecia que estava num filme de surf, e o melhor, era um amigo que surfava.
De todos os moleques que vi surfando aqui no Hawaii, nenhum tinha um surf tão explosivo quanto o Jadson. Ele parecesse que está tomado. Assim que fica em pé na prancha sai manobrando sem parar. Foram as manobras mais fortes e radicais que vi até agora. Sem contar nos inúmeros aéreos que ele deu num mar ridículo. Fomos para casa sempre dando muita risada, porque quando juntam-se 4 meninos na nossa faixa de idade, é claro que falasse muita besteira.
O almoço, mais uma vez foi banquete, aproveitei a receita que o Dinar me mandou e fiz uma lentilha vermelha, que ficou deliciosa. Preparei um antepasto com berinjela, cebola, pimentão e cenoura. Esquentamos o purê e uma massa que o Cau fez na noite anterior, tiramos a salada da geladeira e o banquete estava completo. Até o Julião, que nunca tem fome, comeu um prato e elogiou.
Logo que acabamos o almoço, que começou às 16h, dei uma intimada no Júlio para vermos as pranchas que ele quer vender. Estamos há dias namorando-as, e resolvemos, eu e o Cau, fazer um pacotão, para barganhar um preço melhor. Levamos as pranchas para a sala e ficamos uma duas horas negociando e conversando sobre cada uma delas. Foi muito bom, porque pela primeira vez eu pude ficar falando sobre pranchas, olhando, botando embaixo do braço e ninguém achou isto ruim. O Jadson disse que eu sou o cara mais fissurado em prancha que ele já conheceu, ele falou que fico abobado quando vejo uma prancha, mas naquela noite vi que o Julião gosta mais delas do que eu. Enquanto negociávamos ele olhava para as pranchas com carinho, dava para ver que se pudesse, ficava com todas. Inclusive, quando fechamos negócio, ele dizia:
- Tá, meu, leva esta prancha para o teu quarto, que eu não quero nem vê-las mais.
Eu me diverti demais com tudo aquilo. Queria comprar duas pranchas dele, e toda hora eu fazia uma oferta mais baixa, mas o cara é ruim de negócio, depois de um certo preço, não baixou mais. Acabei comprando uma prancha que vi no primeiro dia e sabia que seria ideal para o Brasil. Tem a possibilidade de usá-la com 4, 3 ou 2 quilhas. Deve andar muito. A outra eu vou deixar pra depois, senão acabo com todo meu dinheiro logo antes de 2008.
O Cau ficou indeciso, apesar de a prancha que ele escolheu ser linda. No fim das contas, o Júlio trouxe a prancha para dentro do quarto e colocou na frente da cama do Cauê, só para ele ficar na vontade de surfar com ela.
Antes de dormir, marcamos, mais uma vez, uma prática para às 7h, antes do surf e do café da manhã. Todo mundo se comprometeu em acordar. Novamente, o Júlio e o Jadson ficaram vendo Tropa de Elite, mas tive que ir ali desligar o computador, porque ambos dormiam antes da metade do filme.
Deitei-me feliz, olhando para minha pranchinha, que só será usada no Brasil.

26/12 - O dia de duas ondas só

O dia começou com tempo nublado, enquanto tomávamos café, o Júlio e o Jadson saíram para ver o mar. Alguém havia dito para o Julião que o mar tinha crescido. Aquela informação apressou nossa refeição, saber que o mar está bom sempre acelera tudo. Fomos para a praia antes de eles voltarem, conferimos Pipeline, que não nos pareceu bom, apesar de estar melhor do que nos outros dias. Estávamos indo em direção à Sunset quando cruzamos com o Vini Fornari, Bruno e Sabrina. Eles nos disseram que a Manuela iria tirar algumas fotos ali em Rocky Point, convidaram-nos para surfar ali, mas eu estava tão afim de surfar Sunset de novo, que nem pensei duas vezes e parti para lá.
A condição parecia estar boa, entravam séries maiores do que no dia anterior ao Natal. Em poucos minutos já estávamos dentro da canal, remando pelo canal. Lá fora notamos que o mar não estava tão consistente quanto no dia 24. As séries demoravam mais para chegar, não tinham tantas ondas, nem eram tão grande quanto no outro dia. Passei um bom tempo boiando lá fora sem conseguir pegar nada de onda. O vento estava muito forte e segurava a prancha lá no alto das ondas, tornando difícil de fazer o drop. Depois de um certo tempo apareceu o Júlião lá fora. Eu e o Cau ficamos bem felizes ao vê-lo, era a primeira vez que surfariamos os três juntos. Ele nos contou que o Jadson tinha ficado em Pipeline, que apesar de não estar com a condição ideal, estava proporcionando uma boa oportunidade de treinar na onda mais concorrida do North Shore, com pouca gente na água. O Finha também deu o ar da graça, era a segunda vez que o via surfando desde que cheguei aqui.
Vi o Júlio pegar uma onda muito boa, descendo-a na parte mais critica, segurando a prancha ao máximo para tentar entubar no drop, algo bem difícil de se fazer ali. Depois olhei para trás e vi muita água voando das manobras que ele fez. Como o mar não estava muito bom, e ele já pegou muita onda nestes 17 anos aqui, o Júlio foi embora logo em seguida.
Eu e meu fiel companheiro Cau, continuamos lá, tentando pegar alguma onda boa. Apesar de as ondas não estarem muito boas, sempre entrava uma ou outra incrível, e era justamente a esperança de surfá-las que nos mantinha no mar. Dentre todas que peguei, apenas uma foi relamente boa. O Cau não achou muita coisa ali também, apesar da nossa persistência.
Saímos do mar comentando como tínhamos surfado mais na outra session, e no caminho para casa, conferimos Pipeline. Não vimos o Jadson, nem muitas ondas boas. O almoço foi uma dos mais incríveis até agora, parecia até comida de mãe, só faltaram elas aqui para nos servir e perguntar se estava tudo bem. Eu fiz uma berinjela gratinada, o Cau caprichou num purê de batatas e uma salada de ovos. Eu já havia feito um tabule de quinua e lavei uma alface. O prato ficou bem cheio, colorida e saboroso. Comentei com o Cauê:
- Em todo estes North Sohre, meu pimpolho, não tem ninguém que esteja fazendo comida em casa e alimentando-se tão bem quanto nós. – Demos risadas.
Depois de uma descanso, fomos à Rocky Point, que tinha um tamanho, boas direitas e pouca água sobre a bancada. Voltei para o carro, preparei as minhas coisas, o Cau ficou na praia, olhando o mar um pouco mais. Deixei a chave com ele, que disse que entraria logo em seguida.
Lá fora, logo que entrei peguei uma direita muito boa, fazendo três manobras fortes, em seqüência. Depois disso, desci uma esquerda boa e tubular, mas quando ajeitei meu pé em cima da prancha, o deck descolou, fazendo com que me pé escorregasse. Tomei uma baita vaca, fiquei assustado, porque não esperava aquele caldo. Aquilo me deixou um pouco atordoado, e não peguei mais nada decente ao longo de todo banho, que acabou com o dia. Saí do mar e já estava escurecendo, meu partner continuava ali, olhando o surf de todo mundo. Comentou-me que achou a condição estranha, e não tinha visto ninguém pegando altas ondas, com exceção do Thiago Camarão, surfista profissional brasileiro que estava fazendo manobras muito fortes mesmo.
À noite, combinei com o pessoal aqui da casa para fazermos uma pratica de SwáSthya Yôga na manhã seguinte. O Jadson e o Júlio ficaram vendo Tropa de Elite até tarde, enquanto eu e o Cau ficamos aqui no quarto rindo de uns vídeos de bobagem no YouTube. Acabamos indo dormir tarde.

25/12 - ...and so merry Christmas

Nem parecia Natal em nossa casa, a rotina continuava a mesma, o Julião saiu cedo para trabalhar e nós saímos em busca de ondas. As ruas estavam mais vazias, talvez pelas festas da noite anterior. Chegamos em Rocky Point e encontramos o Bruno e a Sabrina, que já nos avisaram que o mar tinha baixado e não estava com uma condição muito boa.
Acompanhamos eles até a praia, pois já estavam vestido e iriam surfar de qualquer maneira. As ondas apresentavam-se da pior forma desde que cheguei aqui, e o vento estava quase nos levantando do chão. Resolvemos ir até Turtle Bay, onde fica o tal condomínio em que queremos alugar o apartamento da corretora que insiste em me dar o bolo.
No caminho passamos por algumas praias, e a vegetação foi mudando bastante, apesar de não ser tão longe assim de onde estávamos. O condomínio é muito legal, com piscina, quadre de tênis e campo de golf. Fomos até a praia, onde fica o Turtle Bay Resort, onde tem um hotel que fica praticamente dentro da praia.
Saindo de lá, pegamos o mapa que compramos há alguns dias e decidimos dar a volta na ilha. Ali onde estávamos era o inicio do East Shore. Continuamos pela Kamehameha highway, que dá a volta na ilha, e passamos por praias lindas e uma geografia bem diferente, onde enormes escarpas aproximavam-se da estrada, fazendo-as parecerem ainda mais gigantescas.
O dia estava nublado e choveu muitas vezes ao longo do caminho, e estávamos pensando em conhecer Diamond Head, que é uma cratera de um vulcão inativo há cerca de 150.000 anos. Porém, devido ao mau tempo, decidimos ir conhecer Pearl Harbor, já que vimos no mapa que se pegássemos uma outra rodovia, chegaríamos lá rapidamente. Quando entramos na H1, quase ficamos loucos com tanta beleza. A estrada foi feita em um viaduto, no estilo da rodovia dos Imigrantes, em São Paulo, e passa ao lado de grandes projeções rochosas, cobertas com muita vegetação nativa e algumas cachoeiras. Logo em seguida, a estrada nos levava para dentro de um túnel, escavado na rocha. Ao sair do túnel, passamos por cima de um outro vale, lindíssimo também. Depois o Julião nos contou que este vale é sagrado e foi um processo bem delicado a construção desta rodovia, pois não podia prejudicar a flora do local.
Saímos, então, no South Shore, e seguimos em direção à Pearl Harbor. Deste lado da ilha, fazia sol, e quase não havia nuvens no céu. Então, o Cau falou:
- Pô, meu, se o tempo está bom aqui, porque não vamos para Diamond Head.
Concordei na hora, nos localizamos pelo mapa e rumamos para lá. Chegamos lá e o dia estava com o céu totalmente aberto, e pouco vento. É bem interessante porque você entra dentro da cratera do vulcão , que agora é o Diamond Head State Monumet Park. A impressão que tive é que parecesse com o Coliseu, porque a base é bem plana e em toda a volta, projetam-se enormes paredes de pedra. Claro que atualmente tudo é coberto de muito verde.
Pagamos nosso ingresso e seguimos a trilha que leva ao ponto mais alto dali, a cratera foi utilizada como forte nos tempos de guerra, e lá no alto, foi feito um observatório contra ataques no lado sul da ilha. A caminhada é fácil, e não leva mais de 20 minutos. No caminho, ouviamos várias línguas, japônes, francês, espanhol, inglês e até português. Lá em cima, o visual é incrível, consegue-se ver toda a praia de Waikiki, e uma enorme parte do lado sudeste de Oahu. No oceano, discerne-se os bancos de coral e as partes mais profundas, de acordo com a cor da água.
Ficamos um bom tempo contemplando aquela beleza toda, especialmente o mar, que parecia não ter fim. Dali, via-se a grandeza daquele universo líquido. Você realmente sente-se um grão de areia, no meio de tanto espaço. A natureza, com toda sua magnitude nos faz sentirmos mais humildes, pois suas construções são verdadeiras obras de arte. E ali, aos nossos olhos, tínhamos acesso a uma delas.
Saímos de lá morrendo de fome, mas eu queria passar num hotel onde, eu sabia, estava hospedada uma querida amiga de minha mãe. Ela me conhece desde de muito pequeno, e somos amigos de longa data. Eu já havia ligado algumas vezes para o hotel, mas nunca a encontrava no quarto.
Chegamos lá e ligamos para ela, atendeu seu namorado Sul-africano:
- It`s Lucas? Have a person here that want to talk with you.
Passou o telefone para a Helô, que parecia muito feliz em, finalmente, falar comigo. Disse a ela que estávamos no saguão do hotel, disse-me que desceria em seguida para conversarmos.
Na verdade, está é a primeira vez que ela e seu namorado, Stan, se encontram. Eles tem uma história muito incrível e bonita, como ele mesmo disse:
- A movie story! But that`s the real life, and we are very happy.
Ela estava em um avião indo para Santiago do Chile, sentou na fileira certa, mas no banco errado, para o que a empresa havia determinado, mas o banco certo para o destino de seu coração. Ao seu lado estava este simpático médico, que não deixou que o verdadeiro dono do lugar sentasse ali, indicado-lhe outro assento. Ele estava iniciando uma longa jornada que o levaria à Austrália, onde mora, depois de 3 semanas e meia de viagens pelas América do Sul, onde conheceu Brasil, Argentina, Peru e Chile. Os dois identificaram-se e atraíram-se mutuamente de tal forma, que ao final do vôo, que durou apenas 6 horas, até um beijo aconteceu. Desde lá, eles tem conversado muito pelo telefone, e-mail, sms, msn (é a tecnologia proporcionando romances à distancia!) e agora ele prometeu a ela que instalara o skype. Numa destas conversas ele a convidou para passar o reveillon no Havaí e aqui estão eles, muito felizes com o que a vida lhes aprontou.
Ficamos conversando por mais de uma hora, o papo estava tão bom que nem vimos o tempo passar. Falamos em inglês o tempo todo, pois o Stan ainda não fala português, e foi bom ver que entendi tudo o que foi dito. E ainda consegui me expressar, contar histórias e até fazer piadas. O encontro só acabou porque não agüentávamos mais de fome, e estávamos um pouco preocupados com o valor do estacionamento, já que colocamos o carro dentro do hotel, e não tínhamos muito dinheiro na carteira. Despedimo-nos deles, com a promessa de um novo encontro e ao sairmos da garagem nos foi cobrado o valor de U$14, referente à duas horas de estacionamento. A parte engraçada é que era exatamente, e somente este, o valor que eu tinha na carteira.
Comemos lá em Waikiki mesmo, eles nos indicaram um restaurante, mas nunca encontramos, e chegamos em casa quando já era noite.
Mas tarde, o Julião chegou trazendo um novo integrante para a casa, o Jadson André. Um surfista amador, que ganhou quase tudo que disputou em competições neste ano. Foi campeão brasileiro nas duas principais categorias, Open e Junior, e campeão mundial pelo ISA Games, umas espécie de Olimpíadas do surf.

quinta-feira, 27 de dezembro de 2007

24/12 - Presente de Natal

Acordei antes das 7h, porque tinha marcado de encontrar a corretora de imóveis mais uma vez para irmos ver o apartamento que queremos alugar em janeiro. Abri as janelas, liguei o som, caminhei pelo quarto, conversei com o Cauê, e o que cara não acordou. Como não tinha muito pressa, pois não queria desmarcar novamente com a corretora, apesar de saber que estava dando onda, sentei-me e passei uns 40 minutos realizando um sádhana. E nada do Cauê levantar, ele apenas tinha uns espasmos, desses que temos quando dormimos.
Já eram 7:45 quando dei uns cutucões neles, disse-lhe que estava saindo, mas que na volta era para ele estar pronto. Fui até o local combinado, só que no caminho até lá passei por Sunset, e vi uma série quebrando e aquilo me tirou do sério. Quase não fui lá falar com a mulher, mas honrei o compromisso. Cheguei lá e ela não apareceu, de novo. Na verdade, não esperei muito tempo, mas cheguei no horário, e 10 minutos depois ele ainda não tinha aparecido. Voltei pra casa voando, e o Cau ainda estava meio lento, perambulando pela casa, sem saber direito o que fazer. E eu ao seu lado:
- Vamos nessa, Cau. O mar está clássico. Nossa, tem um Sunset animal.
Como eu sabia que ele jamais conseguiria surfar aquela onda com sua prancha 5’11”, fiz uma pequena loucura. Emprestei a ele minha 7’6”, que eu nunca usei. Combinei um valor, caso a prancha quebrasse ao meio. Botamos as pranchas menores dentro do carro, e as maiores, dentro.
Ao chegarmos na praia, o dia estava lindo, as ondas não paravam de entrar e a adrenalina já bombava em mim, que saí do carro empolgado. Vi que o Finha e o Chaleira estavam sentados na areia, olhando o mar:
- E aí, galera, tem altas, né?!
- Não, não está muito bom. – Disse o Finha.
Segundo eles, estava muito demorado, e iria melhorar perto do meio-dia. Eu olhava lá para fora e não parava de entrar onda. Estava quase pulando de alegria, e disse a eles:
- Cara, eu vou cair porque certamente no Brasil eu não vou surfar nada parecido com isso.
Ambos concordaram comigo, mas o Finha está com uma costela machucada e quer se guardar para os mares clássicos e o Chaleira estava com o prancha no conserto. Voltei para o carro, o Cauê já tinha tirado a prancha que ele usaria da capa, me estendeu o braço com a parafina na mão:
- Quer se o primeiro a colocar a parafa nela?
- Que nada, meu. Coloca você, por enquanto ela é sua.
Também passei um pouco de parafina na minha prancha, enquanto olhava para dentro do mar. Aquilo apenas aumentava minha vontade de surfar ali. Enquanto caminhávamos pelo areia, eu sabia que aquelas eram as maiores ondas que o Cau já tinha visto na vida. Eu havia levado-o, com o meu incentivo, a estar ali, com a prancha debaixo do braço, prestes a remar lá para fora. Olhei para ele, que contemplava uma série quebrando lá fora, senti-me um pouco responsável pelo “meu pimpolho:
- Cara, você está tranqüilo?
- Não, estou tranqüilo.
- Meu, a coisa mais importante que tem é você manter a calma. Independentemente do caldo que você levar ou do tamanho da onda que quebrar na tua frente, o importante é ficar tranqüilo e respirar fundo.
- Não, eu estou sabendo.
- É, e rema pro canal., caso alguma série te pegue.
Para entrar no mar, é preciso deixar que uma ondas quebre na beira, logo em seguida fica fundo. Por isso, você tem que pular por cima de ondas razoavelmente grandes antes de começar a remar. Conseguimos passar por esta fase sem problemas e partimos para o fundo, lado a lado, felizes pela experiência que vivíamos.
Logo que chegamos lá fora, entrou uma onda para mim. Virei a prancha, remei com toda força e entrei nela. Era linda, azul, volumosa e forte. Levou-me com velocidade até a parte de baixo dela, lá olhei para frente e deslumbrei uma imensa pista azul. Fiz uma curva na base e projetei a prancha até o topo da onda, dando uma rasgada forte. Acabei a onda com um cut-back e um sorriso no rosto.
Voltei para o line-up e sentei-me ao lado do Cau. Depois de algum tempo, gritei para ele remar forte numa onda, ele conseguiu entrar nela, pude vê-lo iniciando o drop, depois continuei olhando para trás, querendo saber se tinha conseguido surfar a onda, mas logo outra onda veio, tapando meu campo de visão.
Lá fora, a session estava linda. Vários surfistas bons, conhecidos e anônimos, pegavam ondas volumosas, passavam por mim com velocidade, faziam manobras nas partes mais críticas, com plasticidade e beleza. Toda série que entrava, mesmo que eu não surfasse nenhuma onda, era interessante estar ali testemunhando aquele espetáculo da Natureza. Acho que quando estamos em felizes, sintonizamos com o ritmo do mar, e conseguimos pegar mais ondas. Até eu me impressionei a quantidade de ondas que surfei no meio daquela multidão toda. Claro que nada comparado ao número de ondas que surfamos em um dia clássico em Ibiraquera, por exemplo.
Um tempo depois, consegui avistar o Cauê voltando, com um sorriso no rosto, dizendo-me que a onda havia sido boa, mas que ainda estava se adaptando à prancha. Fiquei mais tranqüilo, ele parecia mais à vontade. Logo em seguida, entrou uma onda boa, eu estava mais no pico do que ele, portanto tinha a preferência. Na verdade, nem reparei se ele estava remando, apenas vire a prancha a comecei a remar. Acontece que o Cau também remou, ao meu lado, e como estava com uma prancha maior (leia-se com mais flutuação e velocidade na remada) ele entrou na onda um pouquinho antes de mim. Assim que ficou em pé, eu também estava ficando, só que acho que desequilibrou-se um pouco, e deixou que seu corpo pesasse para a esquerda, vindo na direção que eu estava dropando a onda. Percebi que se continuasse, aquilo não iria acabar bem, pois iríamos nos chocar. Então, pulei lá do alto e joguei a prancha o máximo que pude para a esquerda, livrando-o, assim, de chocar-se com ela. Submergi um pouco assustado, porque não sabia se minha manobra tinha dado certo. Como não vi nenhuma prancha, nem surfista, na espuma criada pela onda em seu rastro, constatei que tudo tinha dado certo. Bah, esse Cauê me apronta cada uma!, pensei enquanto sentia uma sensação alegre. Eu sabia que ele tinha pegado uma onda grande e boa.
Certa vez, um amigo carioca, que conheci em uma viagem para a Indonésia, disse-me algo que sempre repito para os meus amigos:
- Cara, o surf é um esporte incrível porque todo mundo que está ali surfando, sempre ganha. Não tem perdedor, todo mundo saí feliz. Se você está em uma onda, e pega um tubão, você ganhou. Agora, se o seu amigo pega um tubão na sua frente, você vai celebrar junto, você também ganhou.
Concordou com cada palavra dele, e aquele foi um momento em que, mais uma vez, por ver um amigo, ou mesmo desconhecido, fazendo algo legal dentro da água, senti que eu ganhei.
Depois de algum tempo, encontramo-nos novamente, e ele estava todo feliz. Nem tinha notado que eu havia salvo a ambos com meu pulo kamikaze. Deu risada e disse-me que aquela tinha sido a maior onda de sua vida. Valeu a pena o caldo.
Ficamos mais de duas horas no mar, e saímos cheios de alegria pelo primeiro surf verdadeiramente havaiano da trip. Isto que muito disseram que o mar nem estava tão bom. Imagino quando ficar.
Fomos para casa comer e descansar um pouco. De lá, liguei para Manuela, uma fotógrafa gaúcha que está aqui fazendo um material para o Vinicius Fornari, surfista profissional, também dos Pampas. Eu havia mandando um e-mail para ela, pois sabia que o mar ia crescer, e perguntava se ela faria algumas fotos. Respondeu-me dizendo que estava indo para Rocky Point fotografar o Vini, mandou também o número do telefone que ela comprou aqui. Fazia apenas alguns minutos que ela tinha respondido. Pelo telefone, disse-me que estaria na praia pelas próximas horas. Combinei de passar lá depois do descanso.
Antes das duas da tarde, já estávamos na rua para surfarmos. Levamos comida e bebida para não precisarmos voltar em casa, antes do final do dia. Chegando na praia, tinha altas ondas e muitos surfistas na água. Conversamos com ela, que disse-nos que já havia feito boas fotos do nosso amigo.
- Se você for entra, coloque algo que seja colorida, para que eu poder identificá-lo.
Disse a ela que tinha uma camiseta rosa, meio psicodélica, que eu adoro e com a qual peguei muita onda boa em Noronha, mas estava com vergonha de usar aqui porque sou sempre um dos piores surfistas na água e não quero ficar realçando meu surf fraco. Além disso, aqui o pessoal só uma cores mais sóbrias no mar.
- Que nada, bota esta mesmo.
Quando voltei usando a camiseta, ela me viu, e rindo disse:
- Com certeza, eu vou te encontrar no mar.
Se a menina estava rindo da minha camiseta, imaginei o resto do caras que tinha me visto passar.
Logo que entrei no mar, peguei duas esquerdas boas, manobrando forte, na parte mais veloz da onda. Uma das coisas boas de surfar em Sunset pela manhã, com pranchas maiores, é o fato de, depois, você achar as outras pranchas mais fáceis de manobrar. Até disse para o Cau que temos que sempre começar o dia lá.
Quando saímos do mar já passava das 16h. Então, fomos conferir as outras ondas, para dar a última queda do dia.
O North Shore também é conhecido como 7 miles miracle, porque nesta pequena extensão de terra, há uma quantidade enorme de ondas de qualidade mundial. Nós contamos 20 ondas, mas é possível que tenha algumas que não conhecemos ainda. Estas 7 milhas iniciam-se em Haleiwa, para o oeste, e vai até Velzyland, que fica para o lado leste.
Começamos uma peregrinação que passou por quase todas as ondas. O mar havia baixado, e as séries já não eram tão constantes. Passamos por Sunset beach, fomos até Velzylnad, que não estava bom também. Decidimos conferir Laniakea, é quase no extremo oeste. No caminho, paramos em Pipeline, e depois de conferir Lanis, olhamos a onda que fica ao lado Chun`s reef. Dei a idéia de irmos até Haleiwa, a qual não conhecíamos ainda. Lá as ondas estavam bem fracas, o swell não era propicio para aquela parte da ilha, estava muito de leste.
Quando deixamos a praia de Haleiwa, o sol estava quase caindo atrás das montanhas, o corpo estava bem cansado, e como nenhuma praia oferecia uma condição melhor que do havíamos surfado até ali, resolvemos ir para casa. Porém, no caminho, estacionei na frente de Laniake, eram 17:50, aqui anoitece às 18:30, e disse:
- Cau, se vamos surfar de novo hoje, é agora. Sem pensar, vamos nos arrumar e ir para o mar.
Meu parceiro aceitou na hora, e fomos para dentro do mar. A remada para se chegar até esta onda é um pouco longa, eu podia sentir exatamente os músculos dos braços que estavam sendo trabalhados enquanto ia em direção às ondas. Ainda deu para pegar uma meia dúzia de ondas boas. Quando se tem pouco tempo, damos um valor maior à condição e esforçamo-nos para não errar e extrair o máximo do mínimo. E foi exatamente o que fizemos.
No surf, como em tudo na vida, quando você acerta no que está fazendo, aquilo lhe traz uma estima própria muito grande. Uma consciência e valorização maior de nossas capacidades, o que nos leva, muitas vezes, à auto-superação, puxando os próprios limites para um ponto além do que já conquistamos. Ou então, mesmo se não puxamos os limites, parece que atingimos um nível de acerto incrível, parece que nem existe a possibilidade do erro. O surf nestes poucos minutos do final da tarde foi assim, eu já havia surfado o dia todo, em condições mais desafiadoras que aquela,e tinha caído muito pouco da prancha. Então, fiz tudo certo, manobras, a linha da ondas, a velocidade. Foi demais. Saímos do mar à noite.
Tínhamos um jantar de brasileiros que estão aqui para ir, pois era noite de Natal. Deitamos na cama e quase que não saímos mais. Valeu a pena o esforço, estava bem legal. Tinha umas 30 pessoas, principalmente curitibanos, mas alguns gaúchos. Foi uma forma que encontramos de não deixar o Natal passar em branco. Porém, os presente já nos tinham sido dado naquele dia mesmo, em forma de água em movimento, quebrando sobre bancos de coral.

terça-feira, 25 de dezembro de 2007

23/12 - Sunset, muito prazer!

Ontem foi a primeira vez que liguei meu celular para usar o despertador, pois queria acordar de madrugada para ver a Lua. A hora era ainda a do Brasil, ajustei o relógio e coloquei para que despertasse às 5h. Acordei com o despertador, fui até a porta de frente da casa, mas a Lua parecia um pouco alta ainda, e calculei que se acordasse às 6h, pegaria ela se pondo dentro do mar. Além disso, já era um horário bom para acordar, praticar e sair para o surf. Reprogramei o despertador e voltei a dormir, mas antes que eu pegasse no sono, começou a cair uma chuva barulhenta, a água não parava de cair, adormeci ainda ouvindo o som lá fora. Acordei às 6h, a chuva continuava caindo, o céu estava nublado, nem me dei ao trabalho de levantar, mas estranhei o fato de o céu continuar escuro naquela hora. Como esqueci de ligar novamente o despertador, acordei com luz do dia clareando o quarto. Olhei no relógio do celular e eram 9h, chamei o Cau, dizendo-lhe que tínhamos dormido demais, e já era bem tarde. Como sempre, ele acordou e ligou seu computador imediatamente:
- Que nada, Lucas. São 8 da manhã.
Eu havia ajustado o relógio do celular com uma hora de antecipação, por isso que às 5h a Lua estava alta demais e às 6h ainda era noite.
Saímos de casa com a certeza de que hoje seria um dia de altas ondas. Fomos direto olhar Off The Wall, mas demos de cara com uma condição bem ruim. O vento soprava forte e as ondas continuavam baixas. Dirigimos até Velzyland e lá o vento parecia estar soprando com mais intensidade ainda, pois a onda quebra um pouco mais para fora. O dia ficou nublado, a chuva começou a ficar forte e o desanimo começou a se aproximar de nós. Fomos para Rocky Point, que sempre tem uma onda mais rasa e, talvez por isso mesmo, atrativa. Ficamos dando uma olhada na condição, e reconheci ao longe Fábio Gouveia, grande ídolo do surf nacional, que ficou meu amigo em Noronha, no início deste ano.
Fui até lá trocar uma idéia com ele, que, como em Noronha, está acompanhado com os dois filhos. Conversamos um pouco, ele falou sobre as ondas que poderiam estar boas hoje, as ondas que ele gosta, e no fim falou:
- Ah, os meninos não gostam quando o mar fica assim, mas para mim tanto faz, pode estar grande ou pequeno, eu me divirto do mesmo jeito.
É impressionante por que o cara tem algumas décadas de estrada, e continua surfando e se divertindo como um menino. Lá em Fernando de Noronha era assim também, não importava o tamanho das ondas, ele sempre estava no mar. No fim das contas, ele me incentivou a ir surfar em Sunset, uma das suas ondas preferidas aqui no Hawaii. Saí dali botando a maior pilha no Cau:
- Bah, meu, o Fabinho falou para irmos para Sunset, que vamos pegar boas ondas.
- Mas eu estou com uma prancha muito pequena.
- Ah, não tem problema, Cau. Dá pra pegar umas ondas mesmo assim.
Ele não se animou muito com minha conversa, mas fomos até lá mesmo assim. Tirei minha prancha do carro, logo que estacionamos, mas meu companheiro continuou sentado:
- Ah, vai lá você. Vou ficar por aqui.
Desci correndo pela areia da praia, até o mar. Pulei na água e remei para o fundo. A onda em Sunset Beach quebra bem longe da praia, se comparada com as outras ondas da ilha. Esta onda é uma das mais volumosas que quebram por aqui, é muita água em movimento, mesmo com o mar pequeno. Por isso, todos usam pranchas grandes, em qualquer condição. Estava com uma 6’3”, e apesar de ter surfado algumas ondas, parecia que não conseguia desenvolver uma boa velocidade, faltava alguma coisa para o surf ficar realmente bom.
Não demorei muito para sair da água, caminhei até o carro, mas ele não estava lá. O Cauê havia ido para algum lugar, deixando-me na mão. Fia da p... Fiquei esperando algum tempo para ver se ele voltava, mas como isso não aconteceu, saí andando em direção à casa. No meio do caminho avistei o Finha, que estava indo para o outro lado, mas fez a volta e veio falar comigo. Pedi uma carona, mas ele negou-se com veemência a me deixar entrar, alegando que eu estava molhado. Tentei de tudo, disse que o calção já estava seco, que eu iria sentar no tapete, que iria ficar de pé, que iria no porta-malas, nada adiantou. Ele me recomendou uma carona. Estiquei o dedão e continuei andando. Um pouco depois uma nova-iorquina parou numa caminhonete e levou-me até em casa.
Cheguei em casa, tomei um banho, sentei na cama para ler Proust (como é difícil esta leitura! É necessário toda atenção do mundo para compreender seu texto.). Interei-me com a leitura durante algum tempo, bateu aquele sono, dormi por uns 30 minutos. Acordei-me e fui cozinhar. A indignação que estava com o Cauê por ele ter me deixado à pé na praia começou a se transformar em preocupação. Não era possível que ele tivesse voltado lá e não percebesse até aquele momento que eu já tinha ido embora. Quando já tinha almoçado, o garoto apareceu na porta de trás da casa, dizendo que tinha me esperado lá por todo este tempo. Eu duvidei, daí ele disse que só saiu num momento, rapidamente, para ir numa pista de motos. Ele adora motos, e todos os dias cruzamos com várias delas na caçamba de caminhonetes. Depois ele disse que voltou da pista, não me viu em Sunset e foi surfar em Rocky Point. Ainda não sei bem qual foi a história, mas dei uma dura no menino. Isso não é coisa que se faça com os amigos.
Fiquei em casa por mais um tempo, encontrei o Finha no msn, combinei de passar na casa dele, mais para o final da tarde. Comentei com o ele sobre levar uma prancha maior, e acabei indo com minha 7’2” (Tokoro!). Como o Cauê não iria surfar, pois ia começar a trabalhar num restaurante tailandês, não precisei esperá-lo fazer a digestão, saí logo em seguida.
Ao chegar na casa do Finha, estava lá o Chaleira, amigo que fiz em Imbituba. Eu já sabia que ele estava lá, foi bom revê-lo. Acho que fazia uns 4 anos que não o via. Charles Chaleira Nobre, é um cara muito gente fina, tranqüilão e que pega altas ondas. Ele já morou aqui no Hawaii, tem um filho que nasceu em Oahu, e tem um surf incrivelmente bonito e power ao mesmo tempo. Faz uma linha clássica, e eu sempre o admirava ao vê-lo surfar com seu longboard na Praia da Vila. Naquela época, e até hoje, ele foi um ídolo para mim. Sempre achava bom conversar com ele e pegar ondas ao seu lado. É bom termos estes ídolos mais próximos, porque ele são mais reais, a inspiração fica mais forte. Afinal, a pessoa está ali, ao seu lado, diferente da maior parte dos meus outros heróis no universo do surf, que só vejo surfando em filmes ou revistas. Ele é um destes surfistas fantásticos que existem em todo o mundo, que pegam altas ondas, mas ninguém conhece, não saem em revista, nem em vídeos de surf. Considero-os verdadeiros freesurfers, porque surfam totalmente livres de qualquer compromisso, além dos que tem consigo mesmo. Guiados pelo enorme prazer que este esporte maravilhoso nos proporciona.
Fomos até Sunset beach, e ao chegarmos deparamo-nos com uma condição que não era a mais favorável. Havia bastante vento e as series estavam demoradas. Mesmo assim, o Chaleira botou uma pilha para entrarmos no mar:
- Agora que estamos aí, vamos surfar.
Quando começamos a tirar as pranchas do carro, o Finha apareceu. Ele havia ficado em casa por mais um tempo, resolvendo algumas coisas pelo telefone. Como ele está morando aqui, está mal acostumado, e foi logo falando:
- Está muito mal este mar, magro. Eu não vou surfar.
- Pára, Finha! Vamos cair todo mundo junto, mesmo que seja só para conversarmos lá fora. Lembra a época da Zimba. – Que é como os moradores chama a Imbituba.
- Não. Eu estou com sinusite, vou me guardar para amanhã.
Caminhamos pela areia, pulamos na água e fomos conversando bastante enquanto remávamos. Para se chegar à onda nesta praia, leva-se um certo tempo. O Chaleira me ensinou várias coisas sobre Sunset. Existem ali, duas ondas principais, a clássica Sunset, e Sunset Point, que fica mais para dentro do lugar onde quebra a primeira onda, além, é claro Inside Sunset, quando a onda chega mais na beira. Falou sobre a linha da onda, o tamanho de prancha ideal, a direção do swell. Fiquei bastante atento, porque aquela onda não é simples de se surfar, e com o mar crescendo, eu ia precisar saber bastante sobre aquele lugar.
Já tinha sentido, pela remada, que o surf seria diferente. Toda vez que você surfa com uma prancha maior, a forma de surfar muda totalmente. Há um outro tempo para movimentar a prancha, posicionar-se em cima dela, remar, enfim, é preciso uma adaptação. Na minha primeira onda, coloquei os pés muito para frente, apenas deu para descer reto e fazer a curva lá na base. Já na segunda onda, acertei a base em cima da prancha, a onda era maior e abriu mais. Desci novamente até a base, em Sunset você aprende a importância de um bom drop, fiz uma curva aberta na base, o que me porjetou bem para frente, com enorme velocidade, subi até a parte curva da parede,conhecida como bowl, e apenas virei o bico para baixo. Em seguida, uma sessão quebrou na minha frente, fazendo com que uma espuma viesse em minha direção, projetei a prancha para cima dela, pisei na rabeta, para que o bico passasse por cima daquela água branca, e dei uma batida, descendo novamente. Quando sai da onda, o Chaleira estava sentado em sua prancha, ele havia pegado uma ondas instantes antes, aplaudindo e sorrindo para mim:
- Ah, este é o Lucas que conheço.
Fiquei que era só sorriso. Remeir até ele:
- Foi boa mesmo? Você gostou?
- Nossa, foi demais. Batidão.
- Cara, esta prancha é muito boa.
- É, prancha boa você sente rapidamente que é boa.
Enquanto remávamos de volta ao outside, percebi o que eu estava fazendo naquele momento. Caramba, estou surfando em Sunset! Nossa, que coisa incrível. Este onda é super prestigiada, e sempre ouvia falar dela, dos dias de ondas gigantes, com drops intermináveis e tubos gigantes no inside. Dizem que para um surfista ser completo, é preciso dominar a onda de Sunset, pois ali tem tudo, volume, velocidade, tamanho, extensão, intensidade, tubo. Porém, o que mais me tocou naquele momento, foi a constatação deste sonho que se realizava. É engraçado porque pensamos muito em algumas coisas, e em nossa imaginação tudo parece ter um outra dimensão, um ar mais mágico, quando a realizamos de fato, parecemos entrar em um estado anestésico, que muitas vezes nos cega para a grandeza do que fazemos. Ali, parece-me que tirei este véu de ingenuidade, e pude sentir a realidade de forma plena. E como é espantosa a realidade, como ela profunda, se a vivemos na amplidão do presente.
Surfamos outras ondas, o Chaleira saiu em seguida pois estava com uma prancha emprestada, que não era muito boa. Sai da água muito feliz, e comentei com ele como era boa a sensação que aquela onda produzia em mim:
- Cara, você tem que ver como fica Sunset em um dia de verdade. – Fiquei só imaginando.
O Finha apareceu por ali, ficamos conversando um pouco antes de irmos embora. O mar estava crescendo, e combinamos de nos encontrarmos ali, às 9h do dia seguinte.
Em casa, contei com muita empolgação para o Julião sobre minhas ondas, a prancha, as manobras. Ele apenas me olhava, com sua imensa calma, e dizia:
- Ah é?! E você pegou umas boas?
Imagino que devia estar pensando que aquilo lá não foi nada. Ele já deve ter pegado muita onda clássica nestes 17 anos de Hawaii.
Fiz um tabule de quinua, comi um pouco de massa e fiquei esperando o tempo passar. Estava cansado, mas um pouco antes as 22h, sai de casa para buscar o “meu pimpolho”, como apelidei carinhosamente meu partner Cauê. Ele ficou muito feliz em ver-me. Eu apensa mencionei que talvez fosse buscá-lo, mas não tínhamos marcado nada. Voltamos para casa, e eu segui falando do surf em Sunset, acho que ela está se tornando minha onda preferida. Comemos um pouco dos pratos que o Cau ganhou no seu trabalho, e fomos dormir com a expectativa do swell, que entraria na manha seguinte.

domingo, 23 de dezembro de 2007

Dilema

Todos os dias quando sento-me para escrever este diário da viagem, entro em um certo dilema sobre se devo ou não mantê-lo, se é importante dedicar alguns minutos do meu dia neste relato ao invés de estar na rua, na praia, ao vento, ao sol, à luz da Lua.
Sinto-me um pouco como Arturo Bandini, personagem do romance de John Fante, Pergunte ao Pó, quando este jovem adulto escreve para o seu editor dizendo-lhe de seu desejo em escrever um lindo romance sobre um história de amor. Acontece que ele, solto num mundo cruel que lhe apresenta várias dificuldades e dilemas, nunca viveu este sentimento de uma maneira verdadeira. O editor lhe responde, que, na vida, ou você vive tudo que há, ou escreve sobre estas coisas. Esta é a grande qualidade do escritor, relatar coisas que, muitas vezes, nem sentiu.
Sempre penso nisso antes de começar a escrever. Será que estou deixando de viver pelo fato estar relatando tudo? Estou vivendo tudo para depois relatar? Poderia viver mais intensamente, se não estivesse tão preocupado com tudo isso?
De qualquer forma, diariamente, aceito o desafio de viver intensamente tudo que a viagem tem me proporcionado, e ao mesmo tempo, guardar estas experiências na memória, através da palavras escrita. Para que depois, lendo novamente minha viagem, possa revivê-la, mesmo que só em meu íntimo. E possa compartilhá-la, através das histórias que vão nascendo com os dias, com outras pessoas.

22/12 - Só alegria

Acordei cedo para o horário que tinha ido dormir, 7:30h, sentei em cima do meu cobertor, sobre o qual tenho praticado, e iniciei um sádhana. Acontece que estava com tanto sono, que os olhos começaram a pesar, a cabeça queria descansar um pouco mais. Resolvi abrir mão de minha prática, que não ia render nada naquele estado, e voltei para a cama. Acordei com o Cau chamando-me:
- Ô Lucas, teu encontro com o mulher não era às 10h?
Tinha esquecido totalmente que havia combinado com uma corretora de encontrá-la num mercado próximo à nossa casa para ir conhecer o apartamento que pretendo alugar. Faltava 10 minutos para o horário combinado e acordei num pulo. Liguei para ela, que remarcou o local do encontro para o Ted`s Bakery, uma padaria em frente à Sunset Beach. Dirigi até lá esfregando os olhos, estacionei e esperei por cerca de 30 minutos, e nada dela aparecer. Achei que tinha entendido errado, ou que havia me desencontrado dela mesmo, e voltei à casa para ligar novamente.
Ela contou-me que achou estranho porque logo que eu cheguei lá, ela saiu dirigindo para que eu a seguisse, mas logo em depois eu havia sumido. Ela me contou que eu estaria numa caminhonete azul, e disse-lhe que ela tinha feito confusão, meu carro é prata e eu não a tinha visto em lugar nenhum. Remarcamos para segunda-feira pela manhã. Acho que terei que remarcar, porque vai estar dando altas ondas. Ao que tudo indica, no dia de Natal e até o Reveillon, vai dar muita onda boa por aqui.
Eu e o Cau fomos para Waimea Bay para mais um dia de treinamento. Fizemos nossos abdominais, apoios e conduzi uma sessão de ásanas, a técnica corporal do Yôga. Foi uma forma diferente de ensinar, porque normalmente não estou muito preocupado em fazer as técnicas enquanto estou dando a aula, preocupo-me especificamente na correção e aperfeiçoamento do aluno. Porém, ali eu queria também fazer minha prática de ásanas, então eu induzia para ele e para mim. As coisas que eu falava, não aplicavam-se só para ele, eram informações também para que eu fizesse correto. Muitas vezes isso não acontece, porque o instrutor tem que estar tão atento à turma, que deixa de cuidar dos detalhes da própria execução. Cada vez que mudávamos de uma posição para outra, o Cau dizia:
- Bah, mas essa é muito boa. Alonga tudo aqui... Nossa, se fizermos isso todo dia, antes do ano novo estaremos muito bem.
Saímos dali e fomos dar um mergulho no mar, aproveitamos para pular de uma pedra enorme que existe no canto da praia.


























Estávamos caminhando de volta para casa, quando encontramos o Bruno e sua namorada Sabrina, pegando praia no canto oposto ao que estávamos. Bruno estava com uma máscara de mergulho e convidou-me para carregar pedras no fundo do mar, uma prática que os surfistas de ondas grandes fazem para preparar-se para seus desafios dentro do mar. Ele estava com uma máquina de tirar fotos dentro da água e ficamos fazendo aquilo por um bom tempo. Gostei bastante da experiência, a gravidade diminui dentro da água e a consegue-se pegar pedras enormes, a sensação de caminhar lá embaixo também é bem prazerosa. Voltei para a areia e emprestei meus óculos de natação para o Cauê. Os dois ficaram na água por mais um bom tempo e logo em seguida fui embora. O sol estava muito forte e estava preocupado com uma lentilha que tinha deixado de molho em casa.
O Júlio estava consertando pranchas em sua pequena oficina atrás de casa, e disse-lhe que iria cozinhar:
- Me bota dentro desta barca – disse-me ele.
Coloquei um Caetano para tocar, comecei a preparar o Curry de arroz e lentilhas. Achei que seria pouca comida e resolvi preparar a torta de couve-flor, substituindo o ingrediente principal, que não tínhamos em casa, por brócolis, que já estava na geladeira há algum tempo. Esta receita foi uma das primeiras que fiz em toda minha vida, excluindo, é óbvio, Nissin Miojo e afins, na época em que morei em Ibiraquera. Eu simplesmente adorava fazer aquela torta. Veloso cantava Trilhos Urbanos, o cheiro do farelo de trigo, um dos ingrediente da torta, o sol batendo na janela, tudo isso se condensou para me transportar há um tempo que já não existe, mas que aporveitei muito bem: minha época de adolescente, em que morei naquela terrinha abençoada que é Imbituba. Fiquei muito feliz com aquela sensação, lembrei que meus pais e principais amigos estão lá agora. Eu quase dançava de alegria sozinho naquela cozinha. Ali, distante de tudo que me é tão familiar para mim, em Ibiraquera, senti-me em casa.
O Cauê chegou em seguida, a comida ficou pronta, chamei o Julião. Ele entrou em casa dizendo que não pode comer curry porque lhe faz mal para a barriga. De qualquer forma, adorou a torta. Eu e o Cau detonamos tudo, precisávamos repor as energias. Depois ficamos conversando, sentados no sofá da sala. Enquanto a comida era digerida lentamente.
Ao final da tarde, fomos para Rocky Point surfar, o Zé Paulo, que já deixou a casa, mas veio aqui fazer um barbecue, disse-nos que o mar tinha melhorado. Ele tinha razão, vimos boas ondas quebrando, ao chegarmos na praia. O surf foi muito agradável, vários surfistas bons dentro da água, e mesmo assim deu para pegar uns tubos e fazer algumas manobras. Descobri que a onda de Left Rocky, é a melhor que quebra ali, por isso sempre tem tanta gente disputando-a. Minha saideira foi uma boas esquerda com manobras fortes, até a beira. Ao longo de toda session o mar só melhorou e aumento, parece que a promessa do swell está se concretizando.
O Cauê está desmaiado na cama ao lado, enquanto faço este relato. A luz está acesa, mas o garoto ronca mesmo assim. Quero acordar cedo amanhã, porque parece que as coisas vão ficar grandes a partir de agora. Além disso, um amigo do Júlio que estava aqui, disse-me que lá pela 5 da manhã a Lua, linda e cheia, estará se pondo no mar, e não quero perder.

21/12 - Hanging out

Tiramos o dia para vadiar, tal como Vinícius e Toquinho em sua clássica canção Tarde em Itapuã. Sabíamos que o mar não estaria lá estas coisas, então acordamos sem pressa, tomamos café, pegamos o Bruno na casa dele e fomos para Rocky. As ondas estavam tão fracas, que nós três praticamente deixamos o mar sem surfar. Estes dias pequenos ainda são perigosos por haver pouca água sobre os corais.
Em seguida, fomos curtir uma praia aqui na frente de casa, o dia estava bem claro, como os dias de verão do Brasil. Sentei-me na sombra de uma árvore e fiquei conversando com o Bruno por um bom tempo. Comemos alguma coisa em casa e decidimos dar uma volta por Waikiki novamente e conhecer o Ala Moana shopping, pois lá encontrasse a única loja da Apple da ilha. O Bruno inclusive queria consertar seu ipod, que travou.
Antes disso, queria comprar a roupa de borracha que o Dinar me encomendou. Já tinha reservado um na loja, e o prazo era até esta tarde. Como não tinha recebido confirmação nenhuma dele e sabia que a escola já estaria fechada naquele horário, liguei no celular dele via skype. Ele atendeu todo feliz, estava fazendo acarajés para vários amigos em sua casa. Pediu que todos mandassem beijos pelo telefone, o pessoal deu gritos, e me deu uma vontade de estar lá com aquela turma. O Dínamo, como gosto de chamá-lo, confirmou que ia querer a roupa. Assim, fomos direto em direção à surfshop. Obviamente ficamos lá dentro por quase uma hora, porque entramos só para pegar a roupa, mas ficamos vendo outras wetsuits, os guris experimentaram máscaras de mergulho. No final da compra, pedimos uns pôsteres, e o vendedor nos deu alguns, eu peguei só um, pois não sabia do que era. Quando estávamos entrando no carro eles disseram:
- Nossa, o pôster é muito legal!
- Ah é, do que é?
- Cara, você não viu, é do Pipe Master.
A arte da divulgação do campeonato está realmente muito bonita. Eu nunca consigo guardar muito estas coisas, mas lembrei que o Sandro adora isso. Quando fomos para o Chile em junho deste ano, ele conseguiu trazer o pôster de um campeonato até Porto Alegre intacto. O meu chegou parecendo mais um band-aid gigante. Então, caminhei até a porta da loja, que tinha acabado de fechar. Acenei para o atendente, e disse-lhe que queria mais um pôster, o cara trouxe mais 5. Ficamos dando risada enquanto guardávamos tudo no porta-malas.
No shopping ficamos zoando e dando risada de tudo que acontecia. A loja da Apple é irritante, de tanta coisa que você fica com vontade de comprar. Tem absolutamente todos os acessórios que se possa imaginar. O Bruno conseguiu resolver seu problema, saímos dali, comemos alguma coisa, com um certo peso na consciência porque temos muita comida para preparar em casa, pegamos o Stronda, nome que demos ao nosso carro, tirado de um rap do MC Fox que o Cau me mostrou, cuja letra é capaz de ofender a mais imperturbável das mulheres, e fomos embora.
Acabamos indo dormir tarde, mas determinados a treinar em Waimea no dia seguinte.

sábado, 22 de dezembro de 2007

20/12 - Reencontrando o amigo

Aqui no Hawaii, pelo fato de haverem vários tipos e tamanhos de ondas, os shapers, profissionais que fazem as pranchas, colocam todas as suas criações e inovações em teste. As possibilidades são enormes, então a ilha torna-se um campo de provas de tudo que há de mais moderno ou clássico no surf.
Foi mais ou menos isso que vimos ao surfar em Laniakea pela manhã. Primeiro que havia todos os tipos de surfistas na água, o crowd estava intenso, eram homens, mulheres, crianças, adolescentes, idosos, fortes, magros, gordos, morenos, loiros, negros, mulatos, branquelos, tinha de tudo. Segundo, podia-se encontrar todos os tipos de pranchas ali, triquilhas, quadriquilhas, longboard, shortboard, fishboard, retro-model, monoquilha, biquilha, stand-up board, até uma prancha com dois bicos apareceu lá no meio de todo mundo.
A onda de Laniakea é o que eles chamam de mellow, ao menos nos dias pequenos, como novamente o mar se apresentou, por isso a diversidade estava enorme. Já aprendi aqui no Hawaii, que não se pega muitas ondas por session, como acontece no Brasil, então você aprender a apreciar cada onda que passa, mesmo que não seja surfada por você. Sempre fui de olhar muito as ondas das outras pessoas que estão na água, e aqui estou aplicando isso mais ainda. Até porque tem tanta gente boa surfando, que é um aprendizado constante observar o surf dos demais. Quando o surfista não é bom, fico imaginando o que eu faria naquela onda, é um outra forma de curtir o surf.
Saímos depois de umas duas horas de surf. O sol estava bem forte, parecia que não ia chover muito. Dirigi até Haleiwa porque queria ver se conseguia conversar com alguém da imobiliária que aluga casas em um condomínio chamado Kuilima, que fica em Turtle Bay. Consegui algumas informações sobre valores e datas e combinei de visitar o apartamento outra hora.
Quando estávamos indo embora, o Teté, um surfista gaúcho que não via há muito tempo, acenou para mim. Encostei o carro, cumprimentamo-nos e ele pediu uma carona pois estava indo na mesma direção. Ao seu lado, estava um menino de cabelos loiros e nariz queimado, bem moleque. Logo que ele entrou começamos a comentar sobre as ondas, sobre o tempo que não nos víamos,e eu notei que ele conversava com o menino num volume de voz mais baixo, mas não me parecia português, então indaguei:
- Que língua você fala com ele, Teté?
- É italiano.
- Sério, que legal!
- É, eu estou morando lá há 4 anos. Tenho uma escolinha de surf na Itália.
Achei muito curioso uma escola de surf na Itália. Sempre relacionamos este pais com outras coisas, jamais com o surf, mas fiquei feliz por ele. Contou-nos que o molequinho é uma grande revelação, já ganhou vários campeonatos e viajou bastante para sua idade.
Foi inevitável não lembrar da Aninha enquanto olhava aquele menininho parlando dentro do carro. Houve um momento em que vi ele questionar o Teté:
- Ma que língua parlam?
- Portuguese – respondeu meu amigo.
Contei para o Leonardo, em inglês, que tinha feito umas duas semanas de aula de italiano, mas acabei abandonado porque minha professora era surda e gritava demais. Disse-lhe que tinha uma amiga, Ana, que continuou fazendo, e também ficou surda, ainda bem que neste semestre mudou de professora e voltou a falar mais baixo (rsrsrs). Solicitei que o piccolo bambino falasse mais em italiano, mas ele ficou sem graça e não tinha o que falar. Largamos ele em Rocky Point, Leo agradeceu em italiano e despedi-me do Teté, que convidou-nos para tomar um chimarrão com outros gaúchos que estão no North Shore, inclusive morando, como é o caso dos irmãos Lummertz.
Chegamos em casa antes das 11h, fizemos um smoothie do Oliver (valeu, Oliver!), de banana e peanut butter, uma receita super energética. Uns quarenta minutos depois, apareceu aqui em casa o Gui, instrutor de SwáSthya que mora em Oahu e está divulgando esta filosofia na ilha. Eu já estava aqui há 10 dias e ele ainda não tinha conseguido aparecer aí para nos vermos. Me deu uma alegria grande por encontrar um irmão de Yôga por aqui. Eu entreguei para ele alguns incensos e livros que trouxe. Depois saímos para surfar novamente na mesma onda.
Chegando lá as condições pareciam piores do que pela manhã. Fui até o carro do Gui conversar um pouco com ele, tínhamos ido em carros separados pois ele tinha que sair correndo para dar uma aula no meio da tarde. Enquanto ele se arrumava falei:
- Bah, Gui, acho que vou ficar aqui fora só olhando vocês.
- Pô, Lucas, fiquei um tempão esperando vocês, vim até aí. Vamos surfar, meu. Nem que seja para ficar conversando lá fora.
Dei risada. Realmente, era sacanagem não acompanhá-lo. Saí dali, me arrumei e caí no mar. No fim das contas, acabei pegando uma quantidade bem maior de ondas do que pela manhã, pois já não tinha tanta gente no mar, e as séries estavam mais constantes, talvez pela maré seca. Conversei bastante com ele, que me contou das dificuldades de iniciar um trabalho tão distante do Brasil, com pouca estrutura e material humano. Não deve ser fácil estar sozinho aqui, a ilha é enorme, a cultura é distinta e as pessoas que trabalham com a nossa filosofia são bem pouco profissionais.
Contei-lhe que quando cheguei aqui, a menina que mora na casa, a Jeniffer, me disse que tinha começando há poucas semanas a praticar algum tipo de Yôga. Ela disse que funcionava assim:
- Ah, a gente vai lá, e o lugar é muito lindo, tem vários pássaros, nem precisa ligar o som. Fazemos toda aula e no final ele passa um chapeuzinho e colocamos ali uns 2 ou 3 dólares.
Isso dá uma revolta em quem vive deste trabalho. Como uma pessoa vai sobreviver se seus alunos pagam 2 dólares por aula, mais ou menos 24 por mês, ela faz 3 vezes por semana. Eu só posso pensar que a pessoa que faz isso tem outro trabalho, ou aprendeu de uma forma tão rasa o que ela ensina, que não tem noção do valor desta filosofia, e cobra qualquer coisa mesmo. Imagino o quanto isto atrapalha meu amigo, que quer fazer um trabalho profissional por aqui.
O Gui disse que é bem difícil, mas tem lugares legais e está melhorando. Ele pretende abrir sua própria escola aqui. Torço por ele, até porque virei mais vezes pra cá, apenas para ministrar classes e ajudá-lo, obviamente (rsrsrsr).
Depois que ele foi embora, eu e o Cau não demoramos muito a sair da água. Viemos para casa, comemos um pouco mais e resolvemos dar “aquela deitadinha” antes do final do dia. Nem sei que horas acordamos, mas já passava das 21h. Por isso, demorei um pouco mais para dormir à noite. Fiquei conversando com alguns amigos no Brasil já que para eles, era a manhã de sexta-feira. Inclusive a Júlia me passou várias receitas para eu preparar por aqui. Espero que amanhã coloque alguma em ação. Felizmente, caiu um chuva bem forte e bonita durante a madrugada e fiquei a apreciá-la, aguardando o sono chegar, macio como as gotas lá fora.

19/12 - O carro e a garrafa d'água

A impressão que tenho é de que este dia passou em velocidade acelerada. Talvez pelo fato de eu querer resolver logo a questão do carro, talvez por eu ter que esperar por alguém ou alguma coisa, e como isso faz o tempo correr depressa, né?
Acordei e logo o Cau falou com o Bruno, que convidou-o para surfar em Rocky Point, como o Finha ainda não tinha aparecido, resolvi ligar. Ele disse que estava pegando uma amigas, para dar-lhes uma carona, e passaria aqui logo em seguida. Falei para o Cauê ir surfar na frente, ia ficar em casa:
- Hoje quero resolver a questão do carro.
Ele saiu de bike para a praia, e eu fiquei nos sites de locadoras de carro, buscando alguma coisa para ver se valia a pena comprar ou alugar, ainda estava em dúvida. De qualquer forma, preciso alugar um carro para quando meu primo chegar. É que a partir do dia 10 de janeiro, meu primo Icaro chegará na ilha com mais três amigos, e eu serei o responsável por toda molecada. Os pais deles preferem alugar um carro, porque o automóvel é sempre novo, pode-se recorre à locadora, caso algo aconteça, e pode-se ter seguro no carro. O Finha apareceu com duas amigas venezuelanas que estava indo para Maui participar de um campeonato de bodyboard. Além disso, o Finha queria comprar uma camisetas da Surf n` Sea, pois dissemos a ele que estavam em promoção. No caminho para Haleiwa, onde há um centro comercial, ele ligou para seu amigo, que ficou de dar um retorno assim que conseguisse um brecha no trabalho. Largamos as meninas e fomos para a surfshop, estacionamos o carro, entramos na loja e o Finha recebeu a ligação do Alex:
- Lucas, vamos nessa que ele está indo para casa nos mostrar o carro.
E lá fomos nós novamente andar de carro pelo North Shore. Eu estava ansioso por ver logo o carro, resolver o quanto antes isso para poder ir para praia. Doce ilusão, cada carro que o meu amigo via pela rua com placas de vende-se, parava para olhar o preço e analisar o automóvel. Acho que vimos uns 3 carros antes de chegar na casa do Alex. Asism que estacionamos, ele virou a esquina e veio ao nosso encontro. Alex é um gaúcho de Porto Alegre, que já mora por aqui há 4 anos. Como sempre acontece em nossa cidade, conhecemos várias pessoas em comum, só não nos conhecíamos, ainda. Quando ele falou qual era o carro, foi paixão à primeira vista, eu vi o escort prata estacionado, limpinho, bem cuidado, os bancos e interior bem cuidados, e soube que valeria a pena comprá-lo. Ele abriu o carro, mostrou o motor, ligou o som. Pareceu-me ser bem zeloso com o carrinho, convidou-me, então, para dar um running, e ter certeza de que o carro funcionava bem. Demos um volta na quadra, o Finha mandou eu acelerar bastante para ver se o câmbio automático e, consequentemente, os freios estavam funcionando bem. Pisca alerta, ar condicionado, pára-brisa, tudo estava ok. Voltamos à frente da casa dele e começou a negociação:
- Pô, U$800 está valendo muito a pena, Lucas. – Disse-me o Finha
O Alex olhou para ele sorrindo:
- Não, este aqui não tem como ser por U$800.
- Como não, Alex. Você disse no telefone que por U$800 saia o negócio.
- Não dá, Finha. Se eu vender este aqui, preciso comprar outro, e tenho que dar uma entrada de, no mínimo, U$1.000.
- Ah, pára, Alex, faz negócio aí com teu conterrâneo! O cara está precisando.
Alex me olhou, ele apenas sorria. Acho que já sabia que com o Finha é ruim de negociar, o cara é um vendedor nato. Ele tentou de tudo, ofereceu seu outro carro, um Taurus, ofereceu o carro da vizinha, um calhambeque caindo aos pedaços, mas o meu amigo continuava irredutível:
- Vamos lá, Alex. Depois eu compro tua caminhonete por U$2.500.
- Não, Finha, minha caminhonete não vendo por menos de U$3.000.
- Pois é, mas daí fechamos um pacotão e você me faz este valor especial.
Eu olhava aquilo tudo e ria por dentro. Teve um determinado, em que, de tanta insistência, o Alex quase cedeu à oferta.
- Pois é, não dá. – Falou coçando a cabeça, deveria estar pensando se valia desfazer-se do carro e colocar U$800 na mão. – Agora o Lucas tem que fazer uma proposta.
- Tá, se for U$800 nós levamos agora – eu tinha levado mesmo só U$800 – se for U$1.000, vamos pensar.
Depois o Finha me explicou que esta era uma deixa para que fossemos embora, segundo ele, o vendedor fica com medo de perder o negócio e acaba voltando atrás. Como sou meio burro pra esta coisas, acabei falando:
- Ok, por U$900 eu levo.
Pareceu-me que os dois ficaram felizes, Alex riu, olhou mais um vez para o carro. Finha ainda reclamou:
- Porra, Lucas, ele estava quase vendendo por U$800, devia ter oferecido só mais U$50.
Me deu uma ponta de arrependimento, mas eu estava tão afim de ficar com aquele carrinho que queria acabar logo com a negociação. Para você ter noção de como o Finha é vendedor, nesta hora em que o negócio foi fechado, ele deu um jeito de vender um telefone que não está usando para o Alex, por U$50. Ele sabia que o cara queria comprar mas estava se enrolando, e aproveitou a oportunidade.
O carro estava com toda documentação em dia, mas faltava um adesivo. Aqui nos Usa você tem que pagar um imposto, tipo IPVA, e eles colocam um adesivo na placa com o vencimento, e precisa também fazer uma revisão, após a qual colocam outro adesivo, este no pára-choque. Este segundo que estava faltando, mas segundo ele tinha sido pago. Alex ficou de fazer isso à tarde e ligar avisando, para que voltássemos para pegar o carro.
Saindo dali fomos para a surfshop, onde o Finha demorou uma hora e meia para escolher três camisetas. Eu já não agüentava mais, e quando ele decidiu pelas que finalmente levaria, virou para mim e disse:
- Agora vou ver as bermudas que estão em promoção.
Quase fui embora à pé, por sorte nenhuma agradou o gosto dele. Enquanto ele pagava, o que também demorou, fui até um posto de gasolina que existe na frente da loja, comprar uma água. Entrei na loja de conveniência, fui direto no refrigerador, peguei uma garrafa d’água, abri e fui bebendo enquanto caminhava em direção ao caixa. Quando parei na frente do atendente, um japonês alto, lembrei que só tinha na carteira notas de U$100, que tinha levado para a compra do carro. Então disse:
- Sorry, you have change? – Mostrando-lhe a nota.
Ele fez sinal de que não, fiquei um pouco perturbado, virei-me de costas, olhei para a loja para ver se o Finha estava saindo. Pensei em usar o cartão de crédito, mas era ridículo porque era menos de U$2. Quando voltei a ficar de frente para o atendente, ele estava de dedo em riste, começou a gritar furioso comigo:
- Ei, você não pensa que vai ficar sem pagar a água. Porque você bebeu se sabia que só tinha notas de U$100. Não pense que isso é problema meu, se você não tem troco o problema é seu.
Ele falava cada vez mais alto, mais alterado, eu o olhava nos olhos, ele parecia louco. Tentei ficar calmo, mas nestas horas fica difícil se expressar em outra língua. Disse-lhe que eu iria pagar, que não iria embora, e como eu poderia imaginar que ele não tinha troco. O cara bufava, fiquei com medo que fosse mais um desses psicopatas que existem por aqui, e que eu talvez fosse a gota d’água, no meu caso a garrafa d’água, que faltava para que ele saísse matando todo mundo, começando por mim, claro. Saquei meu cartão de credito imediatamente, pedi que se acalmasse. Ele arrancou o cartão da minha mão, continuo me xingando em inglês ou japonês, nem quis entender, só queria sair daquela loja. Eu não conseguia entender o motivo de tanta agressividade, quase tremia tamanho o choque que levei. O Finha me disse que devia ter gritado também e dito que chamaria a policia para fazer uma denuncia, mas não sou muito disso, além do mais, naquela hora, nem pensava nisso. Aqueles olhos esbuglhados e aquela gritaria me colocaram mais medo que qualquer onda gigante que já quebrou na minha frente. Depois o Alex me falou que vários usuários de crack vão para aquele posto fumar atrás da loja e beber cerveja. Acho que não estou tão mal assim para ser confundido com um viciado em ice, como eles chama esta droga aqui, mas tudo bem, ao menos posso pensar que o japa não é tão louco assim.
Perguntei ao Finha se o Alex tinha ligado:
- Nada até agora. Vamos no super agora, né?
E eu morrendo de vontade de ir para casa, queria surfar. Como carona não tem muita voz ativa, tive que acompanha-lo, inclusive ao McDonalds, depois das compras. Cheguei em casa depois das 14h, tinha saído antes das 10h, comi alguma coisa, vi que a prancha do Cau estava em casa, mas ele não. Fui então para Rocky Point. Era mais um dia de ondas fracas por aqui. Chegue lá e havia poucos surfistas na água e uma condição bem fraca, mas fui para dentro da água de qualquer maneira.
Ao longo da tarde, com a maré secando, as ondas aumentaram um pouco e as séries ficaram mais constantes. Peguei boas ondas antes de o line up ficar cheio de surfistas profissionais, que passaram a dominar as ações. Enquanto durou minha session, quase sozinho, pude pegar ondas rápidas, fazer bottom-turns bem na base da onda, colocando a mão na água, no estilo Tom Curren, um dos meus maiores ídolos, e rasgadas fortes e velozes. Num determinado momento, assaltou-me uma certa melancolia. Eu olhava toda aquela beleza ao meu redor, e parecia não estar ali. Tocou-me, no fundo do coração, um saudades enormes dos amigos queridos, da minha escola, do meu Porto Alegre. Foi então que fiz os cálculos e percebi que, mais ou menos, naquele momento, estava acontecendo o sat chakra de encerramento de ano lá na escola. É uma pratica que fazemos toda semana, para mentalizar as coisas que queremos na vida, aumentar nossa energia e confraternizar. Eu entendi que havia sintonizado com o pessoal de lá, e fiquei mais feliz. Foi o primeiro ano que não estava presente nesta prática, desde que a Unidade Rio Branco abriu, há 6 anos. Sai do mar, com a cabeça limpa de qualquer impaciência ou temor, sentimentos que tinha enfrentado antes do surf.
Coincidentemente, dentro da água, encontrei um cara que conheci em Noronha, em fevereiro. Ele mora em Aracaju e já veio várias para cá. Este mundo é mesmo pequeno, além de encontrá-lo descobri que ele está hospedado na mesma casa de um outro amigo, este baiano.que conheci em Bali, em 99. Ele contou-me que a American Airlines perdeu as 5 pranchas que ele havia trazido para cá, fiquei com uma dor no coração, porque não sei o que faria se chegasse aqui e minhas prancha, não. Estávamos saindo da praia conversando quando, mais uma coincidência, o Alex apareceu bem na hora para mostrar a praia para seu pai, que o visita aqui na ilha. Ele disse-me que o carro estava todo regularizado, com os adesivos, impostos e revisões em dia, e que só não gostaria de trazê-lo para mim, ele mora um pouco longe, porque tem medo de que aconteça alguma coisa no caminho.
Estava pedalando de volta para casa e o Alex me chamou perguntando se eu não queria botar a bicicleta a caçamba e ir com ele, trocar de roupa e buscar o carro. Aceitei de imediato, fui o mais rápido possível em casa, estava ansioso pela aquisição. Ainda passamos no Finha para pegar o tal telefone, e no caminho ainda vi o Cauê na rua, indo atrás de emprego, em Haleiwa.
Chegando lá o Alex me deu uma super atenção, disse que não queria esconder-me nada sobre o carro, principalmente porque eu sou da “terrinha”. Até aquele momento, ele não sabia de nenhum problema mecânico grave do carro e de nenhuma multa, mostrou-me todos os papéis. Na verdade estava ansioso por sair dali com meu carrinho, me senti um pouco como a Nai, quando foi pegar seu carro na concessionária e o vendedor deu-lhe mil explicações antes de libera-la com seu Fit zero quilometro.
Quando liguei o carro, dobrei a esquina e vi-me sozinho pela estrada, houve um sensação de liberdade, podia conhecer toda ilha agora, sem depender de ninguém, surfaria as ondas que escolhesse. Comecei a rir, celebrar, baixei o vidro, botei o braço para fora e para o alto. A Lua brilhava bem no centro do céu, numa noite clara, olhei para as montanhas ao redor, senti-me contente com aquilo. Aumentei o som, tocava uma música clássica, pouco importava, queria aproveitar tudo que o carrinho tinha. Sorri ao longo de todo caminho para casa. Não via a hora de mostrar para o Cau nosso novo meio de locomoção. Ele ficou bem impressionado com conservação do carro, combinamos de surfar Laniakea no dia seguinte, bem cedo. Fomos dormir com a certeza de que aproveitaríamos muito mais a partir daquele momento. Antes de adormecer ainda lembrei de meu amigo Thomas, que esteve aqui na temporada passada, dizendo-me:
- Pô, Luquinhas, mas vale a pena ter um carro para conferir todos os picos.
Agora eu sabia do que ele estava falando, e realmente tinha razão.

sexta-feira, 21 de dezembro de 2007

18/12 - Dia de turista

Ficamos esperando o Finha para irmos até a town alugar um carro, ele se atrasou um pouco com relação ao horário combinado. Queremos conhecer outros lugares além do North Shore, pois a ilha é enorme, e a pé as coisas ficam limitadas. Saindo de casa fomos direto para uma loja de departamento chamada Ross, cujo slogan é Dress for less. É uma loja de departamento gigante, o Finha queria comprar roupas. Saindo de lá fomos em direção à Waikiki. Mesmo dentro da ilha, existem rodovias enormes, de até 6 pistas, e o tráfego é intenso, chegando a ficar engarrafado em alguns trechos.
Antes de irmos à praia, ele nos levou para conhecer Ala Moana e Kaiser bowls, duas ondas que quebram mais no verão, e ficam no South Shore da ilha. Dali, eras possível avistar o Diamond Head, um vulcão inativo aqui da ilha. No caminho até lá o Finha nos mostrou quase todos os lugares onde dá para fazer balada na ilha, o cara gosta muito da “night”.
Quando estávamos chegando, passamos por muitos prédios bonitos, hotéis luxuosos e lojas de grande grifes. Pus-me a pensar porque será que gostamos tanto de conhecer cidades cheias de infra-estrutura e elegância. Ali, no meio de todas aquelas construções humanas, havia muito mais gente do que no lado norte, onde a natureza é muito mais exuberante. Minha conclusão é de que nós, seres humanos, talvez admiremos tanto os lugares assim, por que são realizações de pessoas também. Alguém, algum dia, pensou em tudo aquilo, outros tantos, sacrificaram-se para que tais idéias tornassem-se realidade. Ao contrário da natureza, como a conhecemos, que já está pronta, que possui uma vida própria, um construção feita de uma forma tão biológica e antiga, que não conseguimos conceber sua grandeza com tanto facilidade. Talvez pelo fato de que não foram nossos pares que a construíram, e isso não nos dá um dimensão exata da energia despendida para realizá-la.
Eu sempre admirei muito as cidades, não sei se consegui me fazer entender com relação às minhas reflexões naquela hora, mas este novo pensamento que nasceu em mim, me fez sorrir e gostei ainda mais do nosso passeio.
Estacionamos o carro, e fomos à famosa praia de Waikiki assistir alguns surfistas aprendendo a surfar e apreciar um belíssimo pôr-do-sol. Tinha uma estátua de Duke Kahanamoku, um nadador e surfista havaiano que divulgou o surf para o mundo. Para onde quer que viajassem em suas competições de natação, leva um prancha consigo. Fico imaginando como as companhias aéreas cobravam para o transporte, pois na época as pranchas eram enormes e pesavam mais de 50 quilos. Ele foi um grande embaixador do esporte, e é uma figura lendária. Vários turistas ficam tirando fotos na frente de suas estátua, mas não sei se todo mundo sabe exatamente quem ele é. Obviamente, como todo bom visitante, também registramos nossa visita à Duke. Depois ficamos andando pelas ruas, conhecendo as lojas, vendo os hotéis e as enormes limousines que andam por lá.Bom, desde que cheguei por aqui o Cauê parece estar preocupado apenas com três coisas: bonés, adesivos e camisetas de times de basqueteball. Entramos em uma loja que só vendia bonés e chapéus, cheios de estilo. Imagina a alegria da criança lá dentro. Tivemos que arrasta-lo para fora, pois ele não queria sair (rsrsrsrs).Saindo dali o Finha encontrou um loja em promoção, ele acabou não comprando nada na Ross. Ficou lá por um bom tempo experimentando várias roupas. Num determinado momento, eu e o Cau perguntamos para a vendedora o valor de um protetor solar super resistente à água que tínhamos comprado numa outra loja, só para conferir se era mais barato. Ela disse-nos:
- Ah, este é muito caro, U$21,00.
Estranhei o fato de ela achar tão caro um protetor tão bom. O Cauê me falou que por aqui os protetores mais caros não passam de U$10,00. Quando dissemos a ela que no Brasil alguns chegam a custar o equivalente a U$60,00, a menina quase caiu para trás. Perguntou se éramos ricos.
É engraçado ver que nossa moeda, que nos custa muito trabalho para ser conquistada, tem um poder aquisitivo bom aqui nos USA, e é revoltante ver o quão caro pagamos por coisas simples aí na nossa terra. Apensar de que, com relação a frutas, verduras e muitos outros alimentos, não podemos reclamar de nossa terra Brasilis. Aqui custa bem caro alimentar-se de uma forma saudável. Todas as comidas que você pode imaginar , aqui você encontra nos grandes freezers de congelados. Como dizia um amigo carioca que conheci no Chile:
- No Brasil é uma desgraça, você cospe a semente de um fruta no chão e na semana seguinte tem uma árvore frutífera no seu quintal. – E dava risada com isso.
Obviamente, enquanto o Finha pagava por suas compras, o Cauê pediu alguns adesivos. Em casa descobri que ele tem até uma pasta para guardar todos os adesivos que pega pir aí.
Passeamos um pouco mais pelas ruas e lojas, lembrei muito da Nai porque ela teria adorado aquele monte de lugares charmosos e bonitos que conheci.
Depois disso, ainda passamos no aeroporto para que eu pudesse alugar meu carro. Eu já estava um pouco irritado com esta novela do automóvel, porque cada um que te encontra fala uma coisa diferente:
- Compra!
- Não, aluga.
- Aluga, mas sem seguro.
- Sem seguro é roubada.
- O melhor ée comprar porque não queima o dinheiro.
- Mas e se você compra e demora pra vender?
- Compra direto com os proprietários.
- O melhor é se garantir com as concessionárias.
Nossa, aquilo estava me deixando louco. Resolvi que iria até o aeroporto alugar um carro de qualquer jeito, Tinha dito para o Cau:
- De hoje não passa, garoto. Acabou a chinelagem, vamos ficar encarangados.
Passei por 4 locadoras, e elas não me ajudaram nem um pouco. Os valores estão bem altos por causa das festas de final de ano. Além disso, já queria ter alugado um carro para quando meu primo chegar, dia 10 de janeiro, e ficar até ir embora, 5 de fevereiro. Acontece que aqui eles só podem alugar o carro por 30 dias, depois tem que estender a locação, mas eles não podiam me dizer ao certo o valor depois dos 30 dias, porque isso muda toda hora. Enfim, uma confusão! Mesmo assim, fiz os orçamentos e fui para o carro conversar com meu partner Cauê. Chegando no carro, nem deu para dizer os valores, pois o Finha logo falou:
- Aê, magro, nem te estressa que consegui um carro pra ti.
Ele havia dito para um amigo, o Alex, que queria comprar um carro. E o Alex ligou para ele oferecendo um escort da namorada por U$1.000,00.
- Mas por uns U$800,00 ele vende.
Fiquei meio frustrado por sair dali sem carro, mas contente pela possibilidade de comprar algo bom e barato. Fomos em direção casa divertindo-nos e rindo bastante pelo dia de turista que tínhamos vivido.

quinta-feira, 20 de dezembro de 2007

17/12 - O sonho do galo e o final do campeonato

Em meus sonhos havia um galo que cantava sem parar. Eu lembro que estava conversando com o Andy Irons, surfista havaiano, de quem não sou muito fã, a o galo ficava atrapalhando a conversa. Não conseguia escutar o que o cara dizia. De repente, abri os olhos e percebi que o galo era do mundo real, ele não cessava sua cantoria, o que me obrigou a levantar. Na sala já estava o Julião, sempre o primeiro a acordar na casa.
- Daí Julião, e o campeonato?
- É, parece que vai começar às oito.
Acordei o Cauê, que dorme do lado do computador, literalmente. Pedimos que visse se o campeonato tinha começado, e adivinha quem estava na aula? Andy Irons. Chegamos na praia a tempo de vê-lo surfar sua última naquela bateria. Quando o locutor anunciou o resultado, lembrei do galo atrapalhando minha conversa com o havaiano. Ele havia perdido para um surfista local.
Na praia encontramos o Pedro “Manga” Aguiar, surfista gaúcho big rider. No ano passado dropou um onda enorme no Tahiti. Ele tinha chegado no dia anterior da Polinésia Francesa, onde passou os últimos dois meses. Está se recuperando de uma lesão no joelho que fez lá mesmo. Contou-nos que entraram ondas gigantes por lá e ele não pôde surfar, apenas remou lá fora, o que já é um feito apreciável.
Fomos mais para a frente de Off the Wall, aquela onda que quebrou minha prancha. Apesar de o campeonato ser o Pipeline Master, e Pipeline ser uma onda que quebra para o lado esquerdo, se você vai para o lado direto, ela recebe o nome de Backdoor. Normalmente, neste campeonato, só se surfam estas duas ondas na competição, mas as condições estavam tão difíceis que neste dia os surfistas podiam também surfar nesta Off the Wall. É que aqui as ondas são uma ao lado da outra, então era só eles remarem um pouco para o lado, que teriam uma terceira opção para desempenhar seu surf. No fim das contas, ali acabou sendo o lugar onde mais surfaram até o fim do campeonato.
Encontrei o Tony mais uma vez, e com ele estava o jornalista Kiko Carvalho. No dia anterior o Tony tinha feito uma foto das minhas costas, porque talvez (veja bem, talvez!) eu saia na Fluir. Eles farão uma pauta sobre um surfista que está no Hawaii pela primeira vez, e o escolhido fui eu. Fiquei muito feliz, mas não posso contar vantagem antes da hora, porque não é certo ainda. Conversei com o Kiko sobre minhas aventuras e impressões da ilha.
Assistimos todas as baterias do round 4, achávamos que o campeonato seria encerrado depois disso, porque a condição era realmente lamentável, até os surfistas profissionais pareciam sem muita vontade de surfar. Num determinado momento o narrador disse que os atletas que haviam classificado-se para o round seguinte deveriam aguardar na praia, pois talvez a competição fosse adiante. Viemos para casa comer alguma coisa, e o Zé Paulo, que estava trabalhando no evento confirmou-nos que acabaria tudo naquela tarde. O Bruno, irmão do Cauê, apareceu aqui convidando-nos para surfar. Peguei minhas coisas e estava saindo com ele, mas o Cau estava ocupado falando com a namorada, via skype. Achamos que ele logo acabaria, esperamos um pouco, mas acabamos deixando o caçula para trás.
Chegamos na praia e o Kelly havia perdido sua bateria das oitavas-de-final. Entramos no mar bem ao lado das baterias, e foi muito legal assistir de dentro da água as disputas dos melhores surfistas do mundo. Eu nem estava muito preocupado em surfar, até porque minha prancha estava muito grande para o tamanho das ondas. Além disso, havia tantos surfistas bons, que estava me sentindo um duro no meio daquela molecada. Eu e o Bruno saímos da água logo depois da última semi-final, iria acontecer um intervalo antes da final, mas eu estava tão triste de ter visto o pior Pipe Mater dos últimos anos, que fui pra casa tomar um banho e acompanhar a final pela internet mesmo. Acho que foi minha forma de protestar.
No jantar servimos restê d ontau, um incrível prato francês que o Julião não conhecia. Ele reclamou um pouco no início, porque queria um prato nos, mas acabou gostando.